terça-feira, dezembro 30, 2025
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Bolsonaro nega tentativa de golpe e diz esperar por “ajuda externa”

Apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro participaram na tarde deste domingo (6) de um ato na avenida Paulista, na região central da capital paulista, convocado por ele, para pedir a anistia aos envolvidos nos ataques de 8 de janeiro em Brasília. O protesto começou por volta das 14h e ficou centralizado na defesa do projeto de lei em tramitação na Câmara dos Deputados que concede anistia a condenados pelos atos antidemocráticos.

Em seu discurso Bolsonaro, defendeu a cabeleireira Débora Rodrigues Santos, presa por participação no ataque golpista e por ter pichado a estátua “A Justiça”, em frente ao Supremo Tribunal Federal (STF), com um batom. Manifestantes vestidos de verde amarelo mostravam batons em referência a Débora, que já teve a prisão domiciliar concedida.

Segundo a Procuradoria-Geral da República, ela aderiu ao movimento golpista desde o fim das eleições de 2022, e é suspeita de apagar provas e atrapalhar o trabalho de investigadores e da Justiça.

Durante sua fala, Bolsonaro disse acreditar que se estivesse no Brasil em 8 de janeiro teria sido preso, o que não ocorreu porque ele viajou para os EUA em 30 de dezembro de 2022. “Algo me avisou. Se eu estivesse no Brasil eu teria sido preso e estaria apodrecendo até hoje ou até assassinado”.

O ex-presidente lembrou que a falta de um dos filhos no ato, Eduardo Bolsonaro, que se licenciou do mandato de deputado federal e se mudou para os Estados Unidos alegando perseguição política. Segundo ele, Eduardo tem contato com pessoas importantes do mundo todo. “Tenho esperança que de fora venha alguma coisa para cá”.

Inelegível

Além de Bolsonaro, estavam presentes na manifestação o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas; o de Minas Gerais, Romeu Zema; o do Paraná, Ratinho Junior; o do Amazonas, Wilson Lima; o de Goiás, Ronaldo Caiado; o de Mato Grosso, Mauro Mendes; e o de Santa Catarina, Jorginho Mello (PL). Parlamentares e outras autoridades, como o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, e o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, também participaram do ato.

Bolsonaro está inelegível por 8 anos, até 2030, porque a Justiça Eleitoral entendeu que a reunião com embaixadores estrangeiros, em julho de 2022, no Palácio da Alvorada, teve uso eleitoral. Na ocasião, o então presidente, fez afirmações sem provas, desacreditando o sistema eleitoral brasileiro.

Ele é réu por tentativa de golpe, junto com mais sete pessoas, desde o mês passado, desde a decisão unânime da Primeira Turma do STF. Os cinco ministros votaram para aceitar a denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR). A partir de então, Bolsonaro e os outros réus, passarão a responder a um processo penal que pode condená-los à prisão.

Fonte: Agência Brasil

União Europeia busca unidade em primeira ação contra tarifas de Trump

Os países da União Europeia tentarão apresentar uma frente unida nos próximos dias contra as tarifas de importação dos Estados Unidos criadas por Donald Trump, provavelmente aprovando um primeiro conjunto de contramedidas direcionadas a até US$28 bilhões em importações de produtos norte-americanos, de fio dental a diamantes.

Tal medida significará que a UE se juntará à China e ao Canadá na criação de sobretaxas retaliatórias contra os EUA, em uma escalada do que alguns temem que se torne uma guerra comercial global aberta, tornando os produtos mais caros para bilhões de pessoas e levando as economias de todo o mundo à recessão.

O bloco de 27 países europeus enfrenta tarifas de importação de 25% sobre aço, alumínio e automóveis e tarifas “recíprocas” de 20% a partir de quarta-feira para quase todos os outros produtos.

As sobretaxas de importação criadas pelo governo Trump abrangem cerca de 70% das exportações da UE para os EUA ─ que no ano passado somaram 532 bilhões de euros – com prováveis tarifas sobre cobre, produtos farmacêuticos, semicondutores e madeira ainda por vir.

A Comissão Europeia, que coordena a política comercial da UE, proporá aos membros no final da segunda-feira uma lista de produtos norte-americanos a serem atingidos com taxas extras em resposta às tarifas sobre aço e alumínio de Trump, em vez de taxas recíprocas mais amplas.

A lista deverá incluir carne, cereais, vinho, madeira e roupas dos EUA, bem como goma de mascar, fio dental, aspiradores de pó e papel higiênico.

Um produto que recebeu mais atenção e expôs a discórdia no bloco foi o uísque. A Comissão estabeleceu uma tarifa de 50%, o que levou Trump a ameaçar com uma contra-tarifa de 200% sobre as bebidas alcoólicas da UE se o bloco for adiante.

Os exportadores de vinho França e Itália expressaram preocupação. A UE, cuja economia depende fortemente do livre comércio, está empenhada em garantir que terá amplo apoio para qualquer resposta, de modo a manter a pressão sobre Trump para que o bilionário assessorado por Elon Musk reveja as novas tarifas.

Luxemburgo sediará na segunda-feira a primeira reunião política em toda a UE desde o anúncio de Trump sobre as tarifas abrangentes, quando os ministros responsáveis pelo comércio dos 27 membros da UE trocarão opiniões sobre o impacto e a melhor forma de responder.

Diplomatas da UE afirmaram que o principal objetivo da reunião será a obtenção de mensagem unificada do desejo de negociar com Washington a remoção das tarifas, mas com a disposição de responder com contramedidas caso isso não aconteça.

“Nosso maior temor após o Brexit eram acordos bilaterais e uma quebra de unidade, mas isso não aconteceu durante três ou quatro anos de negociações. É claro que aqui temos uma história diferente, mas todos podem ver o interesse em uma política comercial comum”, disse um diplomata da UE.

Contra-tarifas

Entre os membros da UE, há um espectro de opiniões sobre como reagir. A França disse que a UE deveria trabalhar em um pacote que vai muito além das tarifas e o presidente francês Emmanuel Macron sugeriu que as empresas europeias deveriam suspender os investimentos nos EUA até que “as coisas sejam esclarecidas”.

A Irlanda, que tem quase um terço de suas exportações para os EUA, pediu uma resposta “ponderada e comedida”, enquanto a Itália, que tem um governo favorável a Trump e é o terceiro maior exportador da UE para os EUA, questionou se a UE deveria mesmo revidar.

“É um equilíbrio difícil. As medidas não podem ser muito brandas para fazer os EUA virem à mesa de negociações, mas também não podem ser muito duras para levar a uma escalada”, disse um diplomata da UE.

Até o momento, as conversas com Washington não renderam frutos. O chefe de comércio da UE, Maros Sefcovic, descreveu sua conversa de duas horas com os pares norte-americanos na sexta-feira como “franca”, pois disse a eles que as tarifas norte-americanas eram “prejudiciais e injustificadas”.

As contra-tarifas iniciais da UE serão, de qualquer forma, submetidas a uma votação na quarta-feira e serão aprovadas, exceto no caso improvável de uma maioria qualificada de 15 membros da UE, representando 65% da população da UE, se opor a elas. Elas entrarão em vigor em duas etapas, uma parte menor em 15 de abril e o restante um mês depois.

A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, também realizará discussões separadas na segunda e terça-feira com os principais executivos dos setores siderúrgico, automotivo e farmacêutico da UE para avaliar o impacto das tarifas e determinar o que fazer em seguida.

Fonte: Agência Brasil

Milhares de indígenas acampam em Brasília pelo direito à terra

A 21ª edição do Acampamento Terra Livre (ATL) recebe, neste domingo (6), em Brasília, milhares de indígenas de todas as regiões do país em defesa da demarcação dos seus territórios. São esperadas cerca de 10 mil indígenas com previsão de atos e programações entre 7 e 11 de abril.

No acampamento, em meio ao comércio do artesanato indígena, o português se mistura com outras das 274 línguas indígenas do Brasil, na maior mobilização anual dos povos originários brasileiros.  

A indígena Andrea Nukini, de 44 anos, levou quatro dias e quatro noites viajando de ônibus da aldeia do povo Nukini, no município de Mancio Lima (AC), até Brasília. Segundo ela, a falta de demarcação obriga os povos a se manterem mobilizados.

“A nossa luta nunca acaba, porque a gente nunca tem o território totalmente nosso e demarcado. Era para todos nós, povos indígenas, termos nossos territórios demarcados, como manda a Constituição há mais de 35 anos. Mas isso não acontece”, destacou a indígena Nukini.

Marco Temporal

Entre as prioridades do movimento neste ano, como nas edições anteriores, está a luta contra o Marco Temporal, tese que diz que apenas os povos indígenas que estavam em seus territórios na promulgação da Constituição, em outubro de 1988, têm direito à demarcação da terra.

A coordenadora secretária da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), Marciely Tupari, explicou que a expectativa é reverter o cenário atual, criado com a mesa de conciliação estabelecida no Supremo Tribunal Federal (STF) para discutir o Marco Temporal. Indígenas organizados abandonaram a mesa por contestarem sua legitimidade.

“O movimento indígena definiu que estar nesse espaço era validar o que o Gilmar Mendes estava propondo, e uma das propostas era a mineração em territórios indígenas, o que sempre fomos contra. Não fazia sentido a gente estar num espaço para debater os nossos direitos e liberar o nosso território para empreendimentos. Nossos direitos não são negociáveis”, afirmou a liderança.

Após o Marco Temporal ser considerado inconstitucional pelo STF, o Congresso Nacional aprovou a lei que instituiu a tese. O caso, então, voltou para o Supremo e o relator do processo, ministro Gilmar Mendes, abriu uma mesa de conciliação para tratar do tema, solução que vem sendo rejeitada pelo movimento indígena.

Nessa mesa, Gilmar Mendes apresentou proposta de legislação que abre caminho para mineração em terras demarcadas. Posteriormente, a proposta foi retirada, mas voltará a ser tratada em outra conciliação aberta por Mendes. 

“A gente tem exemplo do impacto que a mineração traz para dentro dos territórios e dos nossos rios, como ocorre com os Yanomami e os Munduruku. Os parentes estão sofrendo com a desnutrição, com mercúrio dentro do corpo, os peixes estão contaminados”, justificou Marciely.

Agronegócio e COP30

O ATL 2025 busca ainda articular a pauta dos povos indígenas com a realização da COP30, para convencer os países que vem ao Brasil de que a demarcação dos territórios indígenas é parte da luta contra o aquecimento da terra. A Conferência da ONU para Mudanças Climáticas (COP30) ocorrerá em Belém (PA), em novembro deste ano.

“A gente está se articulando também para fazer, por exemplo, uma NDC [Contribuição Nacionalmente Determinada} indígena, para se contrapor à NDC que o governo lançou na COP do ano passado, quando ele não introduziu os problemas que o agronegócio traz para as mudanças climáticas”, acrescentou a liderança da COIAB.

As NDC são as metas definidas pelos países para redução dos gases do efeito estufa. O governo brasileiro apresentou sua NDC prevendo reduzir em 53% a emissão de gases até 2030. 

‘A resposta somos nós’

Com o tema “A respostas somos nós: Em defesa da Constituição e da vida”, o Acampamento Terra Livre de 2025 é organizado pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e deve receber cerca de 200 povos de todas as regiões do país em cinco dias de programações e protestos à favor da demarcação das terras indígenas.

Fonte: Agência Brasil

Petrobras conclui unidade exigida para licença da Margem Equatorial

A Petrobras deu mais um passo no processo de licenciamento ambiental para explorar a Margem Equatorial brasileira, com a conclusão da Unidade de Atendimento e Reabilitação de Fauna, em Oiapoque, no Amapá. O local é um polo de atendimento veterinário a animais resgatados e vai receber principalmente aves, mamíferos marinhos, tartarugas, golfinhos e peixes-boi.

A estatal informou que recebeu, na última sexta-feira (4), a licença para operara a unidade concedida pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente do Amapá. O local ainda precisa ser inspecionado pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) antes de entrar em funcionamento. Além do centro em Oiapoque, a Petrobras já mantém em prontidão outra unidade em Belém, no Pará, o Centro de Despetrolização e Reabilitação da Fauna. 

Exigência ambiental

A construção do equipamento é uma das exigências para que a empresa possa fazer perfurações para verificar a existência de petróleo no bloco FZA-M-59, em águas profundas do Amapá, a cerca de 500 km da foz do Rio Amazonas.

A Petrobras tenta obter o aval do Ibama para a atividade exploratória desde 2022, e recebeu uma negativa em 2023, que, entre outros pontos, destacava justamente a falta de um plano de proteção à fauna, e de uma unidade de estabilização no local mais próximo possível, para agilizar o atendimento de animais atingidos por eventuais vazamentos de óleo.

A margem equatorial é uma região da costa brasileira que se estende do Amapá ao Rio Grande do Norte, e é considerada uma fronteira exploratória pela Petrobras, com potencial estimado de 9 bilhões de barris. Mas ambientalistas temem que a atividade cause desequilíbrio ambiental, especialmente nas áreas próximas à Amazônia.

Fonte: Agência Brasil

Após impeachment, Presidente da Coreia do Sul é destituído do cargo

O presidente da Coreia do Sul, Yoon Suk Yeol, foi destituído do cargo nesta sexta-feira (4) pelo Tribunal Constitucional, que confirmou o impeachment aprovado pelo Parlamento por causa da imposição da lei marcial que provocou a pior crise política do país em décadas, abrindo caminho agora para uma eleição.

A decisão unânime encerra meses de turbulência política que tem ofuscado os esforços para lidar com a administração do presidente dos EUA, Donald Trump, em um momento de desaceleração do crescimento da quarta maior economia da Ásia.

Eleições

A decisão agora dá início a uma corrida para eleger o próximo presidente dentro de 60 dias, conforme exigido pela Constituição. O primeiro-ministro Han Duck-soo permanecerá como presidente interino até que um novo líder seja empossado.

Lee Jae-myung, o líder populista do Partido Democrático, que perdeu para Yoon por uma margem mínima em 2022, é claramente o favorito, mas enfrenta seus próprios desafios legais devido a vários julgamentos por corrupção.

Os conservadores, por sua vez, têm um amplo campo de candidatos.

“A decisão unânime do Tribunal Constitucional eliminou uma importante fonte de incerteza”, disse o professor Leif-Eric Easley, da Universidade Ewha, em Seul, observando como o próximo governo teria de enfrentar desafios, incluindo as ameaças militares da Coreia do Norte, a pressão diplomática da China e as tarifas comerciais de Trump.

Lei marcial

O presidente interino da Suprema Corte, Moon Hyung-bae, disse que Yoon violou seu dever como presidente com sua declaração de lei marcial em 3 de dezembro, agindo além de seus poderes constitucionais com ações que foram “um sério desafio à democracia”.

“(Yoon) cometeu uma grave traição à confiança do povo”, disse Moon, acrescentando que a declaração da lei marcial criou o caos em todas as áreas da sociedade, da economia e da política externa.

A Human Rights Watch considerou a decisão uma vitória para a resiliência do país, a busca pelos direitos humanos e os valores democráticos.

Milhares de pessoas em um comício que pedia a destituição de Yoon explodiram em aplausos ao ouvir a decisão, entoando “Nós vencemos!”

Já partidários de Yoon reunidos perto de sua residência oficial assistiram à decisão em um telão em um silêncio atônito.

Fonte: Agência Brasil

Forças Armadas já foram anistiadas pelo 8 de janeiro, diz historiador

“Estamos diante de um momento inédito na história do Brasil. Militares de alta patente estão sentados no banco dos réus e vão responder pelos crimes contra a democracia”. Esta é a visão do pesquisador Lucas Pedretti, do Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UFRJ). Para ele, o julgamento dos envolvidos no movimento golpista de 8 de janeiro de 2023 é fundamental.

Lucas Pedretti, no entanto, ressalta a importância da responsabilização institucional das Forças Armadas, de forma concomitante, pelo episódio. Individualizar essa responsabilização, avalia o pesquisador, faz parte da estratégia das Forças Armadas para que as discussões não impliquem em um debate sobre a necessidade de repensar e reformular a instituição.

“Se a responsabilização individual não for acompanhada por um processo pedagógico, político, de disputa de narrativa, não é automática a ideia de que a responsabilização do [Jair] Bolsonaro bastaria como um antídoto para futuros golpes. Porque o sentido político disso vai ser profundamente disputado na sociedade”, defendeu Pedretti, durante o seminário Memória dos 60 Anos do Golpe e Lutas Democráticas da Sociedade Civil, nesta sexta-feira (4), pelo Instituto Vladimir Herzog.

Diferentemente dos réus, “a gente poderia dizer que as Forças Armadas já foram anistiadas. Já foram anistiadas pelo 8 de janeiro, pela [participação no governo] Bolsonaro, pela pandemia, foram anistiadas pela intervenção militar no Rio de Janeiro”. Para o historiador, todos esses são processos conectados.

“A intervenção militar é [de fevereiro] de 2018. Dali a um mês, veio o assassinato da Marielle [Franco]. Dali a alguns meses, viria a eleição do Bolsonaro. E o ator institucional que atravessa toda essa temporalidade são as Forças Armadas”, destacou. Ele acrescenta que a memória é fundamental para consolidar a democracia, mas ela não consolida a democracia de maneira automática.

Não é porque há memória sobre a ditadura que, portanto, a democracia no país estará fortalecida de forma garantida.

“Essa memória que a gente constrói vai encontrar outra memória no plano da disputa política, que é construída do lado de lá. A extrema direita sabe muito melhor que o nosso campo a importância de disputar a memória. Bolsonaro fez política de memória desde o dia zero do governo até o último. A última medida dele foi extinguir a comissão de mortos desaparecidos”, apontou.

O historiador lembrou que o ex-presidente Jair Bolsonaro recebeu, com honras no Palácio do Planalto, a viúva do coronel do Exército Carlos Alberto Brilhante Ustra, que foi comandante do DOI-Codi de São Paulo durante a ditadura. “Ele recebeu o Curió, um assassino confesso, com honras. Bolsonaro jamais apostou na ideia de que ‘falar sobre o passado é remoer’. A extrema direita sabe que disputar a memória não é disputar o passado, mas sim o futuro”.

Fonte: Agência Brasil

Entenda quanto é a dívida pública e por que ela existe

O governo ter dívidas, por si só, não é necessariamente ruim, mas é preciso ter noção das restrições orçamentárias das contas públicas. A avaliação é do economista Marco Cavalcanti, coordenador de Finanças Públicas do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), ligado ao Ministério do Planejamento e Orçamento.

Cavalcanti, que já foi subsecretário de Política Fiscal da Secretaria de Política Econômica do Ministério da Economia, em 2019 e 2020, conversou com a Agência Brasil sobre aspectos da Dívida Pública Federal (DPF), como trajetória e sustentabilidade.

A dívida pública é uma forma de o governo se financiar. Ela surge e aumenta sempre que o governo gasta mais do que arrecada. Quando os impostos e demais receitas não são suficientes para cobrir as despesas, o governo é financiado por credores.

As informações sobre o comportamento da dívida, seus detentores e valores pagos são atualizadas mensalmente pelo Tesouro Nacional, instituição do Ministério da Fazenda.

Professor da Fundação Getulio Vargas (FGV) e da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), o economista descreve que, em 2024, o gasto do governo para honrar compromissos – chamado serviço da dívida – foi de 41,6% do orçamento federal executado.

Dentro desse valor, estão as amortizações e refinanciamentos, que somam R$ 1,658 trilhão (34,3% do orçamento); e os juros, R$ 352 milhões (7,3%).  

Todos esses números referem-se apenas à dívida do governo federal, que é apenas uma parcela da Dívida Bruta do Governo Geral (DBGG) – que inclui governos federal, estaduais e municipais e o Instituto Nacional do Seguro Social.

Esse montante fechou janeiro de 2025 em R$ 8,9 trilhões, o que representa 75,3% do total de riquezas produzidas em um ano pelo Brasil, medidas pelo Produto Interno Bruto.

A quem o país deve

O levantamento mais recente, relativo a fevereiro, divulgado no último dia 28, apontou que o estoque da Dívida Pública Federal era de R$ 7,492 trilhões. Esse valor não significa que precisa ser paga ou refinanciada toda de uma vez só, pois há um escalonamento dos vencimentos, que têm prazo médio de 4,08 anos.

  • R$ 7,178 trilhões são devidos a credores domésticos;
  • R$ 314,34 bilhões a credores internacionais.

Para contrair uma dívida, o governo troca títulos públicos por dinheiro, que é usado para suas necessidades. Em troca, o credor combina receber algo além do mesmo dinheiro emprestado, ou seja, a remuneração da dívida, que é cobrada em forma de juros.

De acordo com o Plano Anual de Financiamento (PAF), apresentado no início de fevereiro, a DPF deve encerrar 2025 entre R$ 8,1 trilhões e R$ 8,5 trilhões.

A remuneração que governo precisa pagar aos credores segue a proporção:

  • 47,77% do estoque atrelada à taxa Selic – atualmente em 14,25% ao ano;
  • 20,54% pré-fixada (taxa fixa acertada no momento da contratação da dívida);
  • 27,51% indexados à inflação;
  • 4,18% corrigidos em dólar.

E quem são os credores?

  • 29,8% da dívida são devidos a instituições financeiras;
  • 24,1% a fundos de pensão;
  • 22,3% a fundos de investimentos;
  • 9,7% a não residentes (estrangeiros);
  • 3,2% a governo;
  • 3,8% a seguradoras;
  • 7,1% a outros.

Pessoas físicas podem deter títulos do governo, seja por meio direto, como investimento no Tesouro Direto, ou indireto, por meio de fundos de investimento, por exemplo.

Necessidade de dívida

O pesquisador do Ipea Marco Cavalcanti explica que quando o governo se financia via dívida, o faz porque não está conseguindo receitas para financiar as despesas, “que são julgadas necessárias pelo governo e, logo, pela sociedade, que é representada pelo governo e pelos congressistas”.

Cavalcanti constata que, às vezes, as pessoas tendem a interpretar dívida como algo negativa, “o que não é o caso”. Ele cita o exemplo dos gastos públicos durante a pandemia de covid-19, iniciada em 2020, que deixou pessoas sem emprego e empresas sem faturamento. Naquele período, governos de todo o mundo se endividaram para prestar auxílios e incentivos à sociedade.

No entanto, ele adverte que é preciso ter cuidado com as restrições orçamentárias, para que a dívida não fuja do controle.

“O problema é que quando a dívida começa a aumentar de forma muito perigosa, pode ter uma trajetória insustentável, então, começa a pesar muito fortemente [o gasto com] os juros no orçamento corrente”.

Quanto maior o gasto com o serviço da dívida, menor o espaço no orçamento para outras despesas como saúde, educação, previdência, funcionalismo e investimentos.

O professor de economia defende que haja mecanismos de controle de gastos públicos, como o arcabouço fiscal, que dita o ritmo de crescimento das despesas do governo de forma que seja possível controlar a dívida pública.

O ex-subsecretário de Política Fiscal aponta, entretanto, que o arcabouço, por si só, não é capaz de estabilizar a dívida, uma vez que algumas despesas do governo, como educação e saúde, têm regras próprias de comportamento.

“Tem um conjunto de outras regras, inclusive constitucionais, que tendem a levar a um crescimento forte da despesa”.  

Cavalcanti ressalta que a preocupação com o gasto público não é uma questão apenas do Brasil. Muitos países adotam regras fiscais para o controle de gastos. “Você impõe uma restrição para evitar um mal maior”.

Fator juros

O coordenador do Ipea assinala que, assim como a economia mensal que o governo faz para pagar a dívida (superávit primário), os juros cobrados pelos credores são elemento central na equação que dita o comportamento da dívida. Quanto menores os juros exigidos, mais fácil controlar a dívida.

Ele explica que a decisão sobre a Selic por parte do Banco Central (BC) não se resume ao controle inflacionário, mas leva em consideração também o apetite de credores pelos títulos da dívida.

“A disciplina fiscal é uma das formas importantes que se tem para tentar reduzir esse risco fiscal, reduzir essa taxa de juros de equilíbrio da economia”, diz.

“Segurar os gastos e evitar desperdícios, melhorar a eficiência do gasto, apontar para uma trajetória sustentável para a dívida pode acabar gerando um círculo virtuoso”, completa ele, indicando que os credores passarão a aceitar juros menores para financiar o governo, medida que faria a dívida pressionar menos o orçamento.

De acordo com o professor, o governo trabalha com o cenário de dívida pública federal crescente até 2027/2028, Com queda a partir de 2029. Já as projeções de instituições do mercado financeiro são mais pessimistas, algumas acreditando na estabilização a partir de 2033.

Fonte: Agência Brasil

IR 2025: onde baixar o aplicativo para declarar o Imposto de Renda?

Os contribuintes têm três opções para fazer a declaração do Imposto de Renda 2025: pelo programa para computadores, pelo aplicativo para celular e pelo portal e-CAC na plataforma Gov.br.

O coordenador do curso de Ciências Contábeis da Faculdade Anhanguera, Amarildo José Rodrigues, explica como funciona cada opção.

Programa gerador

O contribuinte precisa baixar o programa gerador de declaração, disponível no site da Receita Federal do Brasil.

“Essa opção é recomendada para os contribuintes que possuem declarações mais complexas, com muitas informações a serem declaradas”, destaca o professor.

O programa para computadores, chamado IRPF 2025, tem versões para Windows, macOS, Linux e multiplataforma.

Aplicativo para celular

aplicativo da Receita Federal está disponível para os sistemas Android e iOS.

“Essa é uma opção ideal para quem busca praticidade e agilidade no preenchimento da declaração”.

Em 2025, o nome do aplicativo para fazer a declaração mudou. Antes chamado de “Meu Imposto de Renda”, agora recebeu o nome de Receita Federal.

e-CAC

A terceira e última opção é realizar a declaração diretamente no portal e-CAC. É necessário ter acesso e senha na plataforma Gov.br.

Cuidados na hora de baixar programa

O professor Alessandro Pereira Alves, da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), alerta que o único órgão responsável por disponibilizar o programa é a Receita Federal.

“Não se deve baixar o programa de outros sites. Então, tem que ser o programa da Receita Federal”.

Uma forma de garantir que o aplicativo ou programa é autêntico é verificar o endereço do site. Se ele não estiver no domínio Gov.br, há risco de ser um software falso criado para roubar dados do contribuinte.

Isenção para quem ganha até R$ 5 mil já está valendo?

No ano passado, a regulamentação da reforma tributária foi aprovada no Congresso e sancionada pelo presidente Lula. Em 2025, o governo já enviou para o Congresso um projeto de lei que prevê a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil por mês. 

Como as duas notícias tiveram grande repercussão, algumas pessoas têm se perguntado se a reforma tributária e a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil estão valendo para a declaração deste ano. Objetivamente, podemos afirmar que não.

“Sobre a reforma tributária, ela não influenciará no Imposto de Renda. Isso porque a reforma ainda está em andamento e, até agora, apenas a primeira fase foi aprovada, que trata da criação do IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) e da CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços). Essas mudanças afetam apenas o consumo, não o Imposto de Renda. A segunda fase da reforma, que poderia alterar o Imposto de Renda para as Pessoas Físicas, ainda não foi aprovada”, explica Márcia Ferreira de Godoi, professora do curso de ciências contábeis da Faculdade Anhanguera.

Entre as medidas que podem ser aprovadas nesta segunda fase está a prometida isenção para quem ganha até R$ 5 mil. As regras do projeto já estão definidas, mas ainda vão passar por muito debate.

O vice-presidente de controle interno do Conselho Regional de Contabilidade do Estado do Rio de Janeiro (CRC-RJ), Paulo Pêgas, alerta que a novidade ainda deve demorar um pouquinho.

“A pessoa que tenha renda bruta de até R$ 5 mil não pagará mais qualquer valor de Imposto de Renda a partir de janeiro de 2026, caso o projeto seja realmente aprovado na Câmara e no Senado. Agora, isso só valerá na declaração de 2026, que será enviada à Receita Federal entre março e maio de 2027. Entre março e maio do ano que vem, enviaremos a declaração referente a este ano, 2025. Vai demorar um pouco para que haja reflexo na hora da declaração do Imposto de Renda”.

Por enquanto, a faixa de isenção do IRPF é para quem ganhou até dois salários mínimos mensais em 2024. Lembrando que o prazo para declaração do Imposto de Renda vai até a última sexta-feira de maio, dia 30. 

Anti-fake: o governo passou a cobrar IR por transações em Pix?

Em 2025, a série Tira-Dúvidas do IR tem uma novidade: a seção anti-fake do Imposto de Renda 2025.

Em meio ao volume de desinformação na internet, apenas ensinar a melhor maneira de declarar não é o suficiente. É preciso também esclarecer, desmistificar e desmentir as famigeradas fake news. E nesta primeira pílula do anti-fake do IR 2025 vamos falar de Pix. 

Desde janeiro de 2025, se iniciou um debate na internet em cima de uma norma que passaria a obrigar instituições financeiras, inclusive as chamadas fintechs, a notificar a Receita Federal sobre movimentações acima de R$ 5 mil no caso de Pessoa Física. Foi a partir dela que surgiu a informação falsa de que o Pix acima de R$ 5 mil passaria a ser taxado. 

Vamos repetir, apenas para ficar claro: é falso que transações em Pix acima de R$ 5 mil paguem Imposto de Renda. Para começar, a norma não previa criar um “novo imposto”. O professor Paulo Pêgas, vice-presidente de controle interno do Conselho Regional de Contabilidade do Rio de Janeiro (CRC-RJ), esclarece que a norma previa, na realidade, evitar a evasão fiscal. 

“O governo não vai cobrar nenhum imposto nas transações por Pix, não vai ficar monitorando o valor de cada Pix que ninguém passa. A ideia é que realmente se tenha o melhor controle para coibir, evitar sonegação. Aquela pessoa que tem uma  renda que deveria declarar imposto e, às vezes, até pagar, e acaba prejudicando a sociedade como um todo”. 

“Mas não é você, não é aquela pessoa que controla uma festa dos amigos, o almoço de confraternização no final do mês, nada disso. Ninguém vai ter que pagar imposto sobre Pix, a Receita Federal não analisa o Pix individualmente falando para quem foi, o que fez, o que não fez. É mais uma informação global para auxiliar no combate à sonegação”.

Em janeiro, o próprio governo tratou de tomar duas ações para deixar ainda mais claro que não haverá cobrança de impostos. Uma delas foi revogar a normativa que previa a notificação de informações do Pix.

A outra, como explica o professor Deypson Carvalho, da UDF, foi criar uma Medida Provisória que impeça a cobrança de impostos por Pix.

“A Medida Provisória (MP 1.288/2025) editada pelo governo federal garante que as transações feitas por meio do Pix não serão tributadas. Portanto, essa legislação torna público o impedimento formal para a cobrança de valores adicionais e tributos incidentes sobre pagamentos feitos por Pix”.

Vale apontar que as regras do Imposto de Renda 2025 não preveem a incidência de impostos sobre o recebimento de valores por um meio específico. As regras que definem quanto se paga de Imposto de Renda dependem de outros fatores.

Fonte: Rádioagência Nacional

Desinformação sobre autismo no Telegram cresceu 150 vezes em seis anos

Nos últimos seis anos, o volume de desinformação sobre o Transtorno do Espectro Autista (TEA) cresceu mais de 150 vezes nas comunidades da América Latina e do Caribe do aplicativo de mensagens instantâneas Telegram. E ele foi ainda mais intenso nos primeiros anos da pandemia do novo coronavírus, quando apresentou um crescimento de 635%.

Os dados fazem parte do estudo Desinformação sobre Autismo na América Latina e no Caribe, elaborado pelo Laboratório de Estudos sobre Desordem Informacional e Políticas Públicas, da Fundação Getulio Vargas, e pela Associação Nacional para Inclusão das Pessoas Autistas (Autistas Brasil).

Segundo o estudo, o volume de publicações com informações equivocadas sobre o autismo dentro das comunidades conspiratórias apresentou crescimento exponencial nos últimos anos. Em janeiro de 2019, havia apenas quatro postagens mensais sobre o tema, número que saltou para 35 em janeiro de 2020 e chegou ao pico de 611 postagens mensais em janeiro de 2025, crescimento de 15.000%.

A pesquisa analisou mais de 58 milhões de conteúdos publicados entre os anos de 2015 e 2025 em 1.659 grupos conspiratórios sobre o autismo em 19 países da América Latina e do Caribe. Mais de 5 milhões de usuários estavam inseridos nessas comunidades que, segundo os pesquisadores, são relacionadas a movimentos antivacina e de negacionismo climático e terraplanismo.

“A pandemia da covid-19 foi um marco no comportamento digital e na circulação de desinformação. A crise sanitária gerou medo, incerteza e uma demanda intensa por explicações – muitas vezes, em ambientes de baixa confiança institucional”, afirma o coordenador do estudo, Ergon Cugler, em entrevista à Agência Brasil.

“Grupos que antes se restringiam a temas antivacina passaram a incorporar o autismo como nova frente de pânico moral. O que começava como desinformação durante a pandemia foi ganhando tração e se consolidou como um fluxo contínuo de teorias perigosas”, completou Cugler, que é autista, e pesquisador do Laboratório de Estudos sobre Desordem Informacional e Políticas Públicas (DesinfoPop/FGV).

Segundo o estudo, quase 47,3 mil mensagens publicadas nesses grupos traziam informações incorretas ou enganosas sobre o Transtorno do Espectro Autista. O Brasil concentrou quase metade de todo esse conteúdo conspiratório sobre autismo que circulou pelo Telegram no período.

“Infelizmente, o Brasil está em primeiro lugar no continente no que diz respeito à desinformação sobre autismo nessas comunidades do Telegram. As comunidades brasileiras de teorias da conspiração somam 46% dos conteúdos sobre autismo no continente, totalizando 22.007 publicações, alcançando potencialmente até 1.726.364 usuários e somando exatas 13.944.477 visualizações.”

“A Argentina, México, Venezuela e Colômbia também ocupam posição de destaque dentre os países que mais produzem e consomem conteúdos conspiracionistas sobre autismo no Telegram”, afirmou Cugler.

Nesses grupos do Telegram, os pesquisadores encontraram mais de 150 causas incorretas ou mentirosas sobre o TEA que apontavam como agentes responsáveis pelo autismo: a radiação das redes 5G, vacinas, inversão do campo magnético da Terra, consumo de Doritos e até chemtrails [falsa crença que os rastros deixados por alguns aviões no céu são, na verdade, agentes químicos ou biológicos].

Também foram encontradas 150 falsas curas do autismo, algumas delas defendendo o uso de produtos ineficazes e até perigosos “como solução milagrosa”. Alguns dos métodos defendidos nesses grupos como cura para o autismo não tinham nenhuma comprovação científica e poderiam colocar pessoas em risco, provocando danos irreversíveis à saúde. Segundo a pesquisa, essas promessas de cura são vendidas principalmente por influenciadores e grupos que exploram emocional e financeiramente os cuidadores, transformando a desinformação em negócio.

“Muitas dessas ‘terapias’ são comercializadas pelos próprios autores das postagens, transformando o desespero de famílias em negócio”, afirmou Guilherme de Almeida, autista, coautor do estudo e presidente da Associação Nacional para Inclusão das Pessoas Autistas (Autistas Brasil).

O especialista também aponta uma instrumentalização da fé, com promessas de cura pela espiritualidade e incentivos ao abandono de tratamentos médicos, reforçando a culpa sobre pais e cuidadores. Ainda segundo ele, as teorias sobre autismo não estão isoladas.

“Articulam-se com discursos antivacina, nova ordem mundial, negacionismo científico e um caldo ideológico anti-institucional. O estudo mostra como essas redes se organizam, criam sentido, alimentam desconfiança e capitalizam em cima da angústia coletiva”, reforçou.

Uma combinação de estratégias é usada por essas comunidades do Telegram para espalhar a desinformação, destacou Cugler. “Primeiro, elas atuam como bolhas de reforço, ou seja, espaços onde os membros compartilham e comentam entre si as mesmas ideias, criando uma sensação de validação mútua. Em segundo lugar, elas exploram intensamente a linguagem da ciência, usando termos técnicos fora de contexto para dar aparência de credibilidade às teorias”, explicou.

“Por fim, muitos desses grupos funcionam com estratégias típicas de marketing digital: constroem narrativas de medo seguidas da oferta de soluções ‘milagrosas’, vendendo produtos como dióxido de cloro, terapias alternativas e até cursos de ‘desparasitação’ do intestino. Em muitos casos, o mesmo perfil que espalha desinformação também lucra com a venda dessas soluções, o que mostra uma engrenagem organizada de exploração da desinformação como negócio”, completou Cugler.

Almeida alerta que essa desinformação é organizada para servir a interesses. “A desinformação sobre autismo não é inofensiva nem aleatória: ela alimenta um sistema altamente lucrativo. Criou-se uma lógica cultural que naturaliza o autismo como problema a ser corrigido, legitimando uma cadeia de intervenções contínuas que movimenta universidades, certificadoras, clínicas e cursos e algumas grandes ‘corporações da deficiência’”, disse.

De acordo com Almeida, o estudo é a ponta do iceberg de uma indústria operada entre desinformação e lucro, na qual falsas causas e curas são vendidas por quem espalha as mentiras. Essa estratégia não apenas explora financeiramente as famílias, mas também legitima práticas pseudocientíficas e desvia recursos públicos.

“O medo, a culpa e a esperança são convertidas em consumo – e o consumo, em lucro. Não se trata de casos isolados. Estamos diante de um complexo articulado entre economia, política e cultura. A desinformação cumpre papel central nesse jogo: ela abre caminho para o negócio da intervenção e reforça uma lógica onde a existência autista só tem valor se puder ser ‘melhorada’ ou ‘curada’”, observou o presidente da Autistas Brasil.

Riscos

A desinformação, alerta Almeida, gera muitos riscos à sociedade. Além de aumentar os estigmas e a discriminação sobre o TEA, ela também pode comprometer o diagnóstico do transtorno.

“A desinformação sobre o autismo gera riscos profundos e estruturais: compromete diagnósticos precoces, atrasa o acesso a direitos, favorece tratamentos ineficazes ou até perigosos e reforça estigmas que isolam ainda mais as pessoas autistas”, afirma Almeida.

“Alimentada por teorias conspiratórias e interesses comerciais, ela distorce o entendimento público e empurra famílias para soluções milagrosas vendidas por charlatões, em vez de apoios baseados em evidências. Além disso, desvia recursos públicos e privados para práticas pseudocientíficas, enfraquecendo políticas públicas sérias e perpetuando a lógica do autismo como tragédia a ser remediada, em vez de uma condição a ser compreendida e incluída”, explicou.

Um dos aspectos mais preocupantes é que a desinformação acaba levando as pessoas a abandonar os tratamentos oferecidos pelo sistema de saúde, reforça Cugler.

“É um ciclo que afeta diretamente a saúde pública, porque leva pessoas a abandonar o sistema de saúde e adotar práticas sem qualquer respaldo científico – muitas vezes perigosas. Não é apenas uma ameaça informacional: é uma ameaça concreta à integridade física e emocional de famílias inteiras”, acrescentou.

Combate à desinformação

Os pesquisadores defendem que, para combater essa desinformação, são necessárias não só políticas públicas voltadas ao autismo como também informação. Almeida destacou que as pessoas devem sempre desconfiar de conteúdos que circulam em redes sociais, principalmente quando há forte apelo emocional e nenhuma comprovação científica. “Em tempos de mercadores da esperança, proteger-se da desinformação é também um ato de cuidado”, garantiu.

Cugler argumenta que é preciso também responsabilizar criminalmente quem está lucrando com a desinformação e exigir um posicionamento mais responsável das plataformas de redes sociais, que deveriam limitar a circulação de conteúdos que são prejudiciais à saúde pública. Outro aspecto importante nesse processo, diz ele, é a educação “para fortalecer a capacidade crítica diante da desinformação”.

Procurado pela Agência Brasil, o Telegram não se manifestou sobre o estudo.

O que é o TEA

O Transtorno de Espectro Autista (TEA) é caracterizado por dificuldades na comunicação e interação social, podendo envolver outras questões como comportamentos repetitivos, interesses restritos, problemas em lidar com estímulos sensoriais excessivos (som alto, cheiro forte, multidões), dificuldade de aprendizagem e adoção de rotinas muito específicas.

Segundo dados da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), uma em cada 160 crianças em todo o mundo tem transtorno do espectro autista, mas a organização reforça que esse dado representa um valor médio e que pesquisas têm apontado números significativamente maiores.A Associação Nacional para Inclusão das Pessoas Autistas (Autistas Brasil) estima que cerca de 5,6 milhões de pessoas tenham sido diagnosticadas como autistas no Brasil.

Fonte: Agência Brasil

Racismo no futebol cresce, apesar de campanhas, alerta Observatório

Câmeras da TV Brasil, que realizavam a cobertura da primeira divisão do Campeonato Brasileiro Feminino de futebol, flagraram na última segunda-feira (31) um ataque racista que que faz parte de um contexto de aumento desse tipo de violência no futebol. 

O banco de reservas das jogadoras do Sport, que enfrentavam o Internacional em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, foi alvo de bananas. Uma das árbitras identificou o ataque e recolheu a fruta e as casas, o que foi filmado ao vivo pela câmera da Empresa Brasil de Comunicação (EBC).

Diretor do Observatório da Discriminação Racial no Futebol, Marcelo Carvalho, afirma que o monitoramento realizado por sua equipe aponta que o racismo no futebol está crescendo, apesar da maior conscientização sobre o tema.

O observatório divulga, desde 2014, um relatório com denúncias e detalhamentos de casos de discriminação racial nesse esporte.

Em 2014, ano em que o relatório começou a ser publicado, foram registrados 36 casos de racismo no Brasil e no exterior. Cinco anos depois, em 2019, o número já estava em 159 casos. No ano seguinte, 2020, devido ao início da pandemia, o número de casos caiu para 81, mas voltou a subir para 158, em 2021; para 233, em 2022; e para 250, em 2023 – última edição publicada até o momento.

Para Carvalho, é fundamental que a Justiça tome decisões que deixem os racistas com receio ou medo de praticar esse tipo de crime, seja em estádios ou onde mais for.

“Mas a gente precisa também entender que não vamos acabar com o racismo pensando só em punição. Precisamos pensar cada vez mais em conscientização e em educação”.

“As pessoas precisam entender o que é racismo. Precisam entender que o que muitas vezes chamamos de piada é racismo. Caso contrário, as pessoas continuarão perpetuando esse racismo recreativo na forma de piadas que tanto vemos por aí”, acrescentou ao defender esse tipo de cuidado também nas categorias de base dos clubes.

No caso de racismo no jogo entre Sport e Internacional, o time feminino do clube gaúcho jogará com portões fechados nos próximos três jogos como punição, determinou o presidente do Superior Tribunal de Justiça Desportiva, Luís Otávio Veríssimo Teixeira, na tarde seguinte ao jogo, acatando pedido feito pela Procuradoria-Geral da entidade.

O Sport também registrou boletim de ocorrência (BO) na Policia Civil, e o caso também será investigado na esfera criminal, pela Delegacia da Intolerância, em Porto Alegre.

“Nos últimos anos, temos visto uma atuação muito maior dos clubes da CBF no combate ao racismo, mas isso não tem se refletido em punições [contra aqueles que praticaram este crime]. Percebemos que jogadores, clubes, jornalistas e torcedores estão mais conscientes sobre esse problema”, explica o diretor do Observatório, que pondera. “Mas, infelizmente isso não está refletindo nos casos julgados nos tribunais de justiça desportiva. Ao que parece, ali essa conscientização ainda não chegou”, complementou.

Subnotificação

O monitoramento citado por Marcelo Carvalho é feito a partir de denúncias veiculadas pela imprensa. “Recebemos também muitas denúncias por meio de nossas redes sociais e e-mail, mas, até por segurança jurídica, preferimos trabalhar apenas com casos que sejam veiculados na imprensa”, explica o diretor, ao ressaltar que há muitos outros casos que não constam do relatório.

O levantamento mostra que o estado com maior número de incidentes é o Rio Grande do Sul, onde a câmera da TV Brasil fez o flagrante. Foram 89 casos de racismo em estádios gaúchos entre 2014 e 2023, número que corresponde a 24,45% dos 364 incidentes mapeados no período em todo o país.

Em segundo lugar neste ranking está São Paulo, com 57 casos, ou 15,65% do total registrado nos estádios brasileiros. Minas Gerais vem na sequência, com 34 incidentes (9,34%), seguido do Rio de Janeiro, com 25 casos (6,86%), e do Paraná, com 23 casos (6,32%).

As regiões Sul (36%) e Sudeste (32%) respondem por 68% do total de casos de racismo no futebol brasileiro. Já o Nordeste responde por 16%, enquanto a Centro-Oeste e a Norte registraram, respectivamente, 9% e 6% do total de incidentes mencionados desde 2014.

Muitas das denúncias não incluídas no relatório estão relacionadas a campeonatos amadores ou às categorias de base. Pode-se, portanto, concluir que a situação é muito pior do que o apontado pelo levantamento.

“A verdade é que temos uma estrutura extremamente viciada; uma estrutura extremamente racista no futebol, que se dá desde o início de sua prática no Brasil”, observa Carvalho.

“Basta lembrar que o futebol chegou no Brasil como esporte elitista, classista e racista, ainda que, a partir de determinado momento, pela qualidade dos jogadores negros, esse esporte foi se tornando popular, caindo no gosto das pessoas pobres e negras. Mas a verdade é que os primeiros jogadores negros dos clubes eram proibidos de circular a área social, entrando e saindo de seus clubes pelas portas dos fundos”, acrescentou.

Ele lembra que até os dias atuais, com pessoas e instituições cada vez mais cientes da importância de políticas compensatórias como as de cotas, o percentual de treinadores, dirigentes e gestores negros, no futebol, continua quase nulo.

Racismo na Libertadores

A agressão racista em Porto Alegre remete imediatamente a outro caso de repercussão que ocorreu no dia 6 de março, durante uma partida entre as equipes do Palmeiras contra o time Cerro Porteño, no Paraguai, pela Taça Conmebol Libertadores Sub-20.

A exemplo do que acontece em diversas partidas disputadas por times brasileiros nos países vizinhos, um torcedor se direcionava a um jogador brasileiro, fazendo movimentos similares aos de um macaco. No caso, a manifestação racista foi dirigida ao jogador Luighi, do Palmeiras.

Ao final da partida, ao conceder entrevista, o jogador brasileiro, muito emocionado, chorou após o repórter fazer uma pergunta restrita à partida, deixando de lado o ocorrido. “É sério isso?”, disse ele ao ouvir uma pergunta rotineira sobre a partida, deixando de lado a manifestação racista contra ele.

“A Conmebol vai fazer o que sobre isso? O que fizeram comigo foi um crime”, questionou, em meio a lágrimas, o atleta.

A punição contra esse “ato infracional”, segundo a legislação paraguaia, ficou restrita a uma multa no valor de US$ 50 mil. Outra medida punitiva foi a de proibir a presença de torcedores do Cerro Porteño durante os jogos do campeonato. Marcelo Carvalho lamenta a falta de punição aos racistas, até mesmo quando flagrados por câmeras.

“A punição deveria ser uma medida imediata para acabarmos com essa sensação de impunidade que se tem, por nada acontecer contra esses indivíduos racistas”, critica.

Fonte: Agência Brasil