O Ministério Público Federal (MPF) promoveu um ciclo de audiências públicas para discutir os impactos socioambientais do garimpo ilegal no Amazonas. O encontro, que ocorreu de forma virtual, reuniu representantes de órgãos públicos, pesquisadores, lideranças comunitárias, organizações da sociedade civil e gestores municipais para debater soluções e registrar contribuições sobre o enfrentamento à atividade garimpeira irregular.
Durante as audiências, nos dias 6 e 7 de outubro, foram discutidos os impactos do garimpo ilegal no Amazonas como a criminalidade associada, a contaminação por mercúrio e a falta de alternativas econômicas para as comunidades locais. Pesquisadores e representantes de cooperativas defenderam a formalização da atividade e o uso de tecnologias sustentáveis, enquanto lideranças indígenas denunciaram ameaças, escassez de recursos e ausência de proteção estatal. Também houve críticas à falta de políticas públicas e ao formato remoto do evento.
Participaram representantes do Ministério Público do Trabalho (MPT), da prefeitura de Humaitá, do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), do Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam), da Secretaria de Estado de Meio Ambiente do Amazonas (Sema), do Comando Militar da Amazônia (CMA), do Comando do 9º Distrito Naval, da Fundação Oswaldo Cruz – Instituto Leônidas e Maria Deane (Fiocruz/Amazônia), da Universidade de British Columbia, da Universidade do Estado do Amazonas (UEA), da World Wide Fund for Nature (WWF-Brasil), além de outras organizações da sociedade civil, representantes de povos indígenas e garimpeiros.
O evento foi conduzido pelo procurador da República André Luiz Porreca Ferreira Cunha, titular do 19º Ofício da Procuradoria da República no Amazonas, especializado no combate ao garimpo ilegal e na tutela socioambiental da Amazônia Ocidental.
Combate à contaminação por mercúrio
A contaminação por mercúrio, já amplamente discutida em outras situações, também se tornou destaque nos debates. Durante a reunião, representantes de diversas instituições apresentaram alternativas e soluções para enfrentar os impactos causados pelo uso do metal na Amazônia.
O WWF-Brasil destacou iniciativas de cadeias produtivas alternativas ao uso do mercúrio, como a produção de castanha e borracha, e apresentou o Observatório do Mercúrio na Amazônia como uma possível plataforma de monitoramento da contaminação. Por sua vez, o prefeito de Humaitá, Dedei Lobo, propôs o desenvolvimento de um projeto voltado para a eliminação total do uso de mercúrio na cadeia produtiva local.
A Fiocruz Amazônia defendeu a criação de estratégias para amenizar os efeitos da contaminação, com a participação direta das comunidades afetadas e a implantação de programas permanentes de vigilância epidemiológica, além do estímulo a atividades sustentáveis, como o turismo ecológico e a comercialização de produtos de maior valor agregado.
Diante das propostas, o MPF reafirmou que o combate ao crime deve respeitar os limites legais e que todas as informações apresentadas seriam consideradas em sua atuação. O órgão finalizou reafirmando o compromisso de acompanhar os casos relatados de violência e contaminação nas comunidades de Coari e Jutaí, dando prioridade a essas denúncias.
Alternativas econômicas
Durante o encontro, foi destacada a ausência de alternativas econômicas na região, além da necessidade de políticas públicas que substituam a prática do garimpo ilegal.
De acordo com Edilany, servidor público e professor de química e biologia em Humaitá, cerca de 1.400 famílias dependem atualmente dessa atividade ilícita, o que acaba evidenciando o cenário do abandono histórico do Estado, a baixa infraestrutura local e a omissão dos poderes Executivo e Legislativo na promoção do desenvolvimento sustentável.
O MPF concorda que a falta de opções de geração de renda e políticas públicas voltadas à mudança desse o cenário contribui diretamente para a perpetuação da prática do garimpo entre as populações mais vulneráveis.
O procurador André Luiz Porreca Ferreira Cunha ainda destacou que a maior parte dos trabalhadores da extração recebe apenas 10% do valor do ouro retirado. A ausência de alternativas econômicas na região amazônica, segundo ele, favorece a cooptação dessas pessoas por organizações criminosas.
Entre as propostas de geração de renda lícita apresentadas, destacou-se o projeto de piscicultura em tanques-rede no Rio Madeira, que prevê o cadastramento das famílias, o fornecimento de tanques e ração por um ano, a criação de um fundo rotativo e a assistência técnica estatal.
O MPF esclareceu que a execução de políticas públicas não está entre suas atribuições diretas, mas que o órgão pode induzir sua implementação por meio de ações estruturantes. Além disso, os garimpeiros foram encorajados a cobrar de seus representantes eleitos a adoção de políticas voltadas à renda lícita e sustentável.
Ações futuras
O MPF afirmou que não é contrário à mineração, mas sim ao garimpo ilegal, destacando que todas as contribuições registradas durante a audiência serão consideradas na formulação dos próximos encaminhamentos institucionais e de relatórios técnicos.
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